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quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Para reflexão sobre a UFOPA

O MODELO ACADÊMICO DA UFOPA OU QUEM QUER SER PROFESSOR?
Autora: Solange Helena Ximenes-Rocha

Primeiro estranha-se.
Depois entranha-se.
Fernando Pessoa

A partir de 05 de novembro de 2009 a região Oeste do Pará tem convivido com a primeira universidade pública criada no interior de um estado amazônico. A UFOPA chegou trazendo perspectivas de desenvolvimento econômico, científico e tecnológico e no campo da formação de professores a possibilidade de correção de assimetrias históricas no que tange à eliminação da figura do professor leigo.
Este texto não pretende dar respostas à problemática que envolve a formação docente na nossa região, tampouco fazer uma defesa do modelo acadêmico adotado pela UFOPA, embora meu posicionamento em si possa assim ser entendido por estar pro tempore na Diretoria de Ensino da PROEN, mas tão somente trazer uma reflexão possível sobre a questão que envolve o ingresso dos estudantes no semestre interdisciplinar do ICED e a carreira docente.
O ingresso na UFOPA se dá por meio do ENEM, prova aplicada em todo o país que através de eixos cognitivos avalia a apreensão de objetos de conhecimento das matrizes de referência do exame. As matrizes de referência são: ciências da natureza e suas tecnologias; ciências humanas e suas tecnologias; matemática e suas tecnologias; linguagens, códigos e suas tecnologias. O ENEM em si já apresenta um desafio aos professores do ensino médio uma vez que o aluno não tem que dar respostas mecânicas às questões colocadas, mas tem que dominar linguagens, compreender fenômenos, enfrentar situações-problema, construir argumentações e elaborar propostas. Vejo o ENEM como uma avaliação possível dos anos finais da educação básica, nível de ensino que precisa ser pensado e reformulado.
Na UFOPA foram matriculados os alunos com as melhores notas do ENEM (777.58 a maior média e 576.96 a menor média) que foram distribuídos em vinte e quatro turmas ao longo do primeiro semestre interdisciplinar. O percurso acadêmico, que não foi determinado apenas pela avaliação final de formação que representou 30% do Índice de Desempenho Acadêmico, envolveu diferentes formas de monitoramento do rendimento discente
inclusive com um módulo de interação com a base real (IBR) que pressupunha, entre outras coisas, o resgate dos conhecimentos desenvolvidos na universidade e na vida para a “elaboração de propostas de intervenção solidária na realidade, respeitando valores humanos e considerando a diversidade sociocultural” (MEC/INEP, Matrizes de Referência para o ENEM, 2009) a exemplo do preconizado pelas matrizes de referência do ENEM para um de seus eixos cognitivos.
Em decorrência de seu rendimento e de uma das três opções de Instituto que realizou, o estudante seguiu para o segundo semestre interdisciplinar já em um dos cinco Institutos da UFOPA, a saber: Instituto de Ciências da Sociedade, Instituto de Biodiversidade e Florestas, Instituto de Ciências da Educação, Instituto de Ciência e Tecnologia das Águas e Instituto de Engenharia e Geociências. No que se refere ao Instituto de Ciências da Sociedade, no qual está o curso de Direito, havia um discurso recorrente de que seria o Instituto mais concorrido, todavia não foi o que aconteceu, sendo superado em demanda pelo Instituto de Biodiversidade e Florestas.
O ICED ofereceu trezentas vagas das quais cento e quarenta foram preenchidas até o momento. Digo até o momento porque mais de vinte alunos estão solicitando transferência para este Instituto devido oferecer turmas noturnas e, obviamente, vagas. Este fenômeno de opção de um curso tendo em vista o número de vagas e turno de oferta também é presenciado nos processos seletivos de outras instituições de ensino superior, uma vez que muitos estudantes trabalham e não tem outra forma de conciliar sustento e qualificação profissional.
Ao contrário do que muitos afirmam, não foi o modelo acadêmico da UFOPA que determinou o número de opções pelo Instituto de Ciências da Educação, mas o contexto social no qual a profissão está inserida. No antigo Campus da UFPA de Santarém houve anos em que ingressaram nas licenciaturas muito menos alunos que o número de vagas oferecidas. Veja o exemplo do próprio curso de pedagogia em 2007 no qual foram aprovados apenas 11 alunos das cinquenta vagas oferecidas e dos cursos de química e física nos anos 90 do século XX em que havia vestibulares que aprovavam 3 alunos. Nesses casos dá pra dizer que o modelo de ingresso adotado pela UFPA é que limitava a formação de futuros professores?
A opção por uma profissão é influenciada por diferentes fatores, entre eles o prestígio social, as condições de trabalho, a valorização profissional e sua consequente recompensa financeira. No caso da profissão docente este quadro pode ser revertido a partir de políticas públicas que recoloquem os professores em patamar superior de valorização e de
reconhecimento profissional.
A docência tem sido permeada por jargões preconceituosos e depreciativos tais como o amplamente divulgado por Bernard Shaw de que “quem sabe faz, quem não sabe ensina”. Isso é um insulto aos professores. Prefiro pensar como Shulman que rebateu a afirmação de Shaw e afirmou que “quem sabe faz, quem compreende ensina”.
Como formadores de professores, os professores universitários devem se colocar a responsabilidade de revelar a complexidade e riqueza do ensino e combater o senso comum de que ensinar é fácil. Devem do mesmo modo, combater a dispersão à profissão docente e entender que os problemas da educação e da profissão docente não se resolvem apenas no interior da escola e/ou da universidade.
Desse modo, não se nasce professor, se forma professor. Então o curso de formação tem que dar a qualidade necessária para que bons professores retornem à sociedade. Assim, se há uma relação direta entre qualidade e quantidade, como afirma uma das leis da dialética, vale então a pena lembrar que o ICED da UFOPA possui 84 professores, dos quais 29 são doutores e 48 mestres. Com um conjunto de docentes deste porte não há porque duvidar que daqui a alguns anos teremos formado os melhores professores da região porque acredita-se que o quê o professor universitário faz na sala de aula contribui para determinar o perfil do profissional que ele formará (LORTIE, 1988).
É precoce toda e qualquer avaliação sobre o modelo acadêmico da UFOPA e seu reflexo na opção profissional especialmente no que tange à docência como profissão. No campo educacional toda reforma e/ou inovação é lenta e dá-nos a impressão de que se caminha com “botas de chumbo” (MIZUKAMI, 2009). Só o tempo dirá.

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