Roberto Freire *
Na noite
de 28 de agosto de 2013, o Parlamento brasileiro escreveu um dos capítulos mais
vexatórios de seus quase 190 anos de história. Encarcerado em um presídio do
Distrito Federal desde o fim de junho e condenado pelo Supremo Tribunal Federal
(STF), instância máxima da Justiça do país, o deputado Natan Donadon não teve o
mandato cassado após contar com 131 votos favoráveis à sua absolvição, 41
abstenções e 233 pela cassação (24 a menos que o mínimo necessário de 257
votos). Trata-se de mais um episódio que escancara a marcha da insensatez
dominante neste Brasil dos tempos de Lula e Dilma, no qual o menosprezo à
democracia e o desrespeito às instituições republicanas parece ter virado
regra.
Donadon
foi considerado culpado pelo desvio de R$ 8,4 milhões da Assembleia de Rondônia
e recebeu uma condenação de 13 anos, quatro meses e dez dias de prisão pelos
crimes de formação de quadrilha e peculato. Vale lembrar que o próprio STF,
durante o julgamento do mensalão, já havia determinado, por cinco votos a
quatro, que as condenações implicavam a cassação automática dos mandatos dos
deputados mensaleiros. Entretanto, o assunto voltou a ser debatido por ocasião
da recente condenação do senador Ivo Cassol, e os dois novos juízes da Corte,
Teori Zavascki e Luís Roberto Barroso, foram determinantes para que se
consolidasse no tribunal uma interpretação distinta da original, fazendo com
que a decisão sobre os mandatos coubesse exclusivamente ao Parlamento.
O caso
Donadon foi, então, colocado em votação e, para estarrecimento de uma sociedade
que recentemente tomou as ruas para demonstrar sua insatisfação, faltaram votos
para a cassação do mandato do parlamentar. Houve, assim, uma contradição entre
a decisão da Câmara e a declaração de perda de mandato pela Mesa, causada
justamente pela mudança de entendimento do STF. Assim como se diz que a
jabuticaba é uma exclusividade brasileira, agora o país ostenta outra
particularidade: o deputado-presidiário. Ou seja, um parlamentar sentenciado
como criminoso pela mais alta Corte do país, sem gozar de seus direitos
políticos, e que cumpre o mandato na cadeia.
A decisão
envolvendo Donadon não é um caso fortuito. O encadeamento da já citada marcha
da insensatez lulopetista abre um precedente gravíssimo que pode beneficiar os
mensaleiros – esses, sim, muito mais significativos, em todos os aspectos, do
que o inexpressivo deputado de Rondônia, inclusive no que diz respeito à
corrupção.
Seria
interessante que as mobilizações de rua voltassem à carga, se não para reverter
uma decisão já sacramentada, mas ao menos para demonstrar a indignidade
representada pela não cassação de Donadon. Neste momento, talvez mais do que em
nenhum outro em tempos recentes, a sociedade brasileira precisa estar atenta,
já que tramita na Câmara a PEC 33, que limita os poderes do STF e permite ao
Congresso que prevaleça sobre certas decisões da Corte. Também não por mera
coincidência, a iniciativa é de autoria de um deputado petista e conta com
apoio da ampla maioria da bancada do partido.
O triste
espetáculo protagonizado por parte da Câmara nesta semana é um duro golpe
contra todos aqueles que lutam por uma sociedade mais democrática e
republicana. A figura do parlamentar-presidiário simboliza, à perfeição, uma
era sombria nos usos e costumes políticos.
Roberto
Freire é deputado federal por São Paulo e presidente nacional do PPS
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